domingo, 14 de abril de 2019

Hoje

Hoje preciso que me deixes só. Só comigo própria. Só com a vida.

Para pensar em mim. Em nós. 

Hoje preciso que me fales baixinho. Ao ouvido. Para mais ninguém escutar.

Preciso que me digas que vai correr tudo bem. 

Porque hoje estou assim. Sem saber. Sem sentir. A sós com esta dorzinha incomoda que mói e remói. A sós com este vazio que trago cá dentro e que nada nem ninguém parece preencher.

Hoje preciso de paz. Do sossego dos dias. Da calidez das tardes de chuva. Da paz do rio ao fim da tarde.

Preciso de me encontrar. Preciso de te encontrar.

Porque hoje não sei de mim. Porque hoje não sei de nós. E tremo à minha ausência, à tua... que as saudades matam. Através de feridas profundas. Sérias. Fica-se assim, qual leproso à beira da gangrena. 

Hoje estou assim. Neste tédio profundo. Neste marasmo infinito, incessante. Do qual só poderei sair com um abraço teu, com um beijo teu. Mas não dá.

E vejo passar os minutos como uma extensão do tempo, as horas, e continuo aqui. Presa. Indefesa. Impotente. Incapaz de me arrancar a este estado depressivo em que me encontro. 

Tento, mas não sou capaz.

E fico. Fico mais um bocado. Pode ser que chegues.

Pode ser que chegues por fim e me fales baixinho. Ao ouvido. Que te deites ao meu lado e me abraces. Numa ternura sem fim. 

E ficamos. Neste quarto onde a vida pára. O mundo estagna. 

Ficamos a ver a Terra girar. Sozinha. Sem nós. Sem mais ninguém para a acompanhar.

Porque a vida pára quando estás aqui e tudo se ilumina. Tudo fica mais brilhante.

Até as flores já mortas, que jazem na jarra em cima da minha cómoda voltam à vida com a tua presença.

Mas hoje não estás aqui, nem amanhã, nem no dia seguinte.

E eu fico.

Fico a sós comigo.

Sem saber de mim.

Sem saber de nós.

Sozinha neste quarto branco. Estéril.

A ver passar a vida. Sem mais nada. Sem mais ninguém. Sem quereres, ambições ou motivações.

Sozinha. Imóvel. Serena. À espera de paz. Dilacerada pelo vazio.

Morta por dentro. Que as horas já não passam. Que os dias já não correm.

Já nada corre. Tudo parou. Sem ti. Tudo pára. Tudo morre. Tudo some. Tudo enlouquece.

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